domingo, abril 12, 2009
Por sugestão de um amigo, criei um perfil no Facebook. Inicialmente tive alguma resistência, pois não me parecia especialmente interessante. Mas lá acabei por aderir, e até tem uma certa graça. Hoje em dia, a internet proporciona múltiplas possibilidades de socialização - os chats, o messenger, os sites de encontros, etc, além da excelente forma de comunicação que é o e-mail, que veio de certa forma fazer reviver a comunicação escrita. Não tenho grande vocação, nem disponibilidade, para socializar online, de modo que duvido que a minha lista de amigos no facebook cresça por aí além. Mas é divertido; por enquanto serve-me sobretudo para fazer quizes mais ou menos tolos e preencher mapas de viagens.
sábado, abril 11, 2009
Postcards from Italy, de Beirut
A Doença como Metáfora e A Sida e as Suas Metáforas, de Susan Sontag
Muito interessantes, estes ensaios de Susan Sontag sobre a doença como metáforas, sobre a forma como as doenças são encaradas e demonizadas. O primeiro, focado na tuberculose e no cancro, é de longe o melhor, o segundo uma extensão ao caso da sida. A autora demonstra como estas doenças, por muito terríveis que possam ser, são apenas isso - doenças. Não são maldições, nem castigos, nem "privilégios" - no sentido de tornarem as pessoas melhores ou " mais interessantes", como se pensava no século XIX em relação à tuberculose e na primeira metade do século XX em relação às doenças mentais. E mostra com lucidez como o impacto devastador que têm sobre a nossa sociedade tem muito mais a ver com a forma como são encaradas e mitificadas do que propriamente com os seus efeitos directos. A comparação da visão da tuberculose no século XIX e com a do cancro no século XX está muito bem apresentada, e o olhar igualmente lúcido sobre a sida, numa altura (1988) em que esta era ainda uma doença intratável (a grande viragem do tratamento anti-retroviral foi em 1996) é elucidativo e de certa forma tranquiilizador - por haver alguém que saiba expor e desmascarar os mitos da doença ( e do medo da doença) tão bem.
Como médico, o assunto interessa-me particularmente, e também me fez relembrar a minha "relação" pessoal com as doenças - como muitas almas livrescas e algo românticas, também eu tinha na juventude uma visão irrealisticamente idealizada das doenças mentais, como algo que tornava as pessoas mais "interessantes" - as neuroses, as psicoses - tomando como exemplo personagens como Sílvia Nogaret de O Príncipe das Trevas de Durrell. Só quando comecei a lidar ao vivo com a doença mental, primeiro nas enfermarias do Hospital Miguel Bomabarda na Faculdade, depois com alguém que me era muito próximo, me apercebi da verdadeira natureza destas doenças - tais como as físicas, doenças, causa de sofrimento terrível, talvez ainda pior porque levando ao desmoronamento da personalidade, da ideia de nós próprios. Como diz a personagem de Settembrini a Hans Castorp, a certa altura de A Montanha Mágica, a doença em nada "enriquece" nem torna "interessante" quem dela sofre. Causam sofrimento, e geralmente provocam uma degradação de quem sofre; não há nada de romântico nas doenças.
Algumas passagens que considero especalmente significativas:
Além do mais, existe uma particular predilecção dos tempos modernos pelas explicações psicológicas da doença, como de tudo o resto. "Psicologizar" dá uma aparência de controlo das experiências e dos acontecimentos (como as doenças graves) sobre os quais as pessoas de facto pouco ou nenhum controlo têm. Tal realidade tem que ter uma explicação. (O seu real significado é; ou é um símbolo de; ou deve ser interpretada como sendo.) [...] Grande parte da popularidade e do poder de persuasão da psicologia vem-lhe do facto de ser um espiritualismo sublimado: um modo secular, ostensivamente científico, de afirmar o primado do "espírito" sobre a matéria.
Nada é mais repressivo do que atribuir um significado a uma doença sendo tal significado invariavelmente moralista.
O meu objectivo era o de aliviar o sofrimento inútil - exactamente como Nietzsche o formulou, numa passagem de Aurora que li recentemente: Reflexões sobre a doença - Tranquilizar a imaginação do enfermo, a fim de que pelo menos não sofra mais com os seus pensamentos sobre a doença do que com a própria doença - eis o que, na minha opinião, já seria alguma coisa! Seria mesmo uma grande coisa!
(A desconfiança em relação à medicina eficaz, científica, por oferecer tratamentos meramente específicos de determinada doença, e muitas vezes tóxicos, é uma suposição errada recorrente entre pessoas que se consideram esclarecidas.) Esta escolha desastrosa coninua a ser feita por pessoas com cancro, uma doença que muitas vezes a cirurgia e os medicamentos podem curar. [...] Mas submeter um corpo emaciado à purificação de uma dieta macrobiótica é tão útil na cura da sida como fazer uma sangria, o tratamento médico "holístico" por excelência na época de Donne.
Um cenário moderno constante: o apocalipse espreita... e nunca acontece. Aparentemente vivemos a um passo de um dos modernos tipos de apocalipse. [...] O apocalipse tornou-se num acontecimento que está e não está a acontecer.
É sempre bom, e instrutivo, lermos as reflexões de pessoas lúcidas e inteligentes.
Como médico, o assunto interessa-me particularmente, e também me fez relembrar a minha "relação" pessoal com as doenças - como muitas almas livrescas e algo românticas, também eu tinha na juventude uma visão irrealisticamente idealizada das doenças mentais, como algo que tornava as pessoas mais "interessantes" - as neuroses, as psicoses - tomando como exemplo personagens como Sílvia Nogaret de O Príncipe das Trevas de Durrell. Só quando comecei a lidar ao vivo com a doença mental, primeiro nas enfermarias do Hospital Miguel Bomabarda na Faculdade, depois com alguém que me era muito próximo, me apercebi da verdadeira natureza destas doenças - tais como as físicas, doenças, causa de sofrimento terrível, talvez ainda pior porque levando ao desmoronamento da personalidade, da ideia de nós próprios. Como diz a personagem de Settembrini a Hans Castorp, a certa altura de A Montanha Mágica, a doença em nada "enriquece" nem torna "interessante" quem dela sofre. Causam sofrimento, e geralmente provocam uma degradação de quem sofre; não há nada de romântico nas doenças.
Algumas passagens que considero especalmente significativas:
Além do mais, existe uma particular predilecção dos tempos modernos pelas explicações psicológicas da doença, como de tudo o resto. "Psicologizar" dá uma aparência de controlo das experiências e dos acontecimentos (como as doenças graves) sobre os quais as pessoas de facto pouco ou nenhum controlo têm. Tal realidade tem que ter uma explicação. (O seu real significado é; ou é um símbolo de; ou deve ser interpretada como sendo.) [...] Grande parte da popularidade e do poder de persuasão da psicologia vem-lhe do facto de ser um espiritualismo sublimado: um modo secular, ostensivamente científico, de afirmar o primado do "espírito" sobre a matéria.
Nada é mais repressivo do que atribuir um significado a uma doença sendo tal significado invariavelmente moralista.
O meu objectivo era o de aliviar o sofrimento inútil - exactamente como Nietzsche o formulou, numa passagem de Aurora que li recentemente: Reflexões sobre a doença - Tranquilizar a imaginação do enfermo, a fim de que pelo menos não sofra mais com os seus pensamentos sobre a doença do que com a própria doença - eis o que, na minha opinião, já seria alguma coisa! Seria mesmo uma grande coisa!
(A desconfiança em relação à medicina eficaz, científica, por oferecer tratamentos meramente específicos de determinada doença, e muitas vezes tóxicos, é uma suposição errada recorrente entre pessoas que se consideram esclarecidas.) Esta escolha desastrosa coninua a ser feita por pessoas com cancro, uma doença que muitas vezes a cirurgia e os medicamentos podem curar. [...] Mas submeter um corpo emaciado à purificação de uma dieta macrobiótica é tão útil na cura da sida como fazer uma sangria, o tratamento médico "holístico" por excelência na época de Donne.
Um cenário moderno constante: o apocalipse espreita... e nunca acontece. Aparentemente vivemos a um passo de um dos modernos tipos de apocalipse. [...] O apocalipse tornou-se num acontecimento que está e não está a acontecer.
É sempre bom, e instrutivo, lermos as reflexões de pessoas lúcidas e inteligentes.
The Ladykillers, de Joel e Ethan Coen
Ontem vi The Ladykillers, dos irmãos Coen, em video, e fartei-me de rir. É uma comédia negra muito divertida, num tom disparatado e exagerado, mas hilariante. Nunca vi o filme de que este é um remake, e os críticos dizem que é melhor - talvez, portanto, sorte a minha de ter visto este primeiro. Habitualmente não gosto de Tom Hanks, mas aqui está excelente. Soube-me muito bem ver um filme assim, depois de ter adormecido na pretensiosa e sobre-arrebicada "comédia" Duplicity há uma semana.
sexta-feira, abril 10, 2009
As Três Vidas, de João Tordo
Mais um livro de João Tordo, depois de O Livro dos Homens Sem Luz e de Hotel Memória. E é um prazer ver que continua a escrever muito bem, aliás, melhor, pois o seu estilo está a tornar-se mais pessoal e individualizado. Trata-se mais uma vez de uma história muito bem imaginada, de um thriller psicológico que agarra o leitor do princípio ao fim, e se se alonga por vezes um pouco excessivamente nas reflexões depressivas, no conjunto o livro está muito bem conseguido. Dos novos autores portugueses, este continua aparecer-me de longe o mais interessante. Muito bom.
quarta-feira, abril 08, 2009
Crime e Castigo, de Fyodor Dostoievsky
Reli recentemente Crime e Castigo, e foi absolutamente como se o estivesse a ler pela primeira vez. Pergunto-me mesmo onde teria a cabeça quando o li há muitos anos - a resposta é simples, no entanto: num período conturbado da minha vida e mais absorvido em outros assuntos. Mais precisamente, foi num Verão em que andava profundamente infeliz por uma paixão sem esperança, e a estudar Anatomia I, a cadeira mais terrível do 1º ano - e acho que de todo o curso - de Medicina. Durante cerca de um mês li, entre outros de que não me lembro, Crime e Castigo e Fado Alexandrino. O segundo detestei, e o primeiro não me deixou qualquer impressão e esqueci-o quase completamente. Só muitos anos depois me apaixonei por Dostoievsky, ao ler Os Possessos; desde então li vários, sempre com o mesmo entusiasmo, e fui adiando a releitura de Crime e Castigo - talvez com receio de uma decepção - até agora.
E de facto não sei como me pôde deixar indiferente... Falta de maturidade? Não é o melhor de Dostoievsky - gostei mais de Os Possessos, Os Irmãos Karámazov e O Idiota, por exemplo - mas é excelente. Dostoievsky escreve sempre com uma paixão inigualável, as suas personagens são sempre terrivelmente fortes e reais, a sua descrição dos sentimentos, violentos e angustiantes, é sempre poderosa e convincente. O dilema da escolha, da responsabilidade pessoal do Bem e do Mal, e neste caso da culpa e do remorso, é um dos seus temas recorrentes e que expõe sempre como um mestre. Como diz Virginia Woolf em The Common Reader, somos arrastados num turbilhão de emoções tempestuosas (se não diz exactamente isto, é algo do género, num ensaio excelente sobre os romances russos), mas saímos desse turbilhão mais vivos e conscientes, e mais ricos; deixamos a poeira assentar e sentimos que compreendemos melhor o mundo e as pessoas. Decididamente, gosto imenso de Dostoievsky.
E de facto não sei como me pôde deixar indiferente... Falta de maturidade? Não é o melhor de Dostoievsky - gostei mais de Os Possessos, Os Irmãos Karámazov e O Idiota, por exemplo - mas é excelente. Dostoievsky escreve sempre com uma paixão inigualável, as suas personagens são sempre terrivelmente fortes e reais, a sua descrição dos sentimentos, violentos e angustiantes, é sempre poderosa e convincente. O dilema da escolha, da responsabilidade pessoal do Bem e do Mal, e neste caso da culpa e do remorso, é um dos seus temas recorrentes e que expõe sempre como um mestre. Como diz Virginia Woolf em The Common Reader, somos arrastados num turbilhão de emoções tempestuosas (se não diz exactamente isto, é algo do género, num ensaio excelente sobre os romances russos), mas saímos desse turbilhão mais vivos e conscientes, e mais ricos; deixamos a poeira assentar e sentimos que compreendemos melhor o mundo e as pessoas. Decididamente, gosto imenso de Dostoievsky.
domingo, abril 05, 2009
Gran Torino, de Clint Eastwood
Mais um belo filme de Clint Eastwood. Nostálgico e melancólico, mas com momentos de humor, profundamente afectuoso, e transmitindo uma mensagem de esperança para a América, de integração e continuação dos valores que constituiram o core da formação do país, simbolizados na aproximação progressiva do velho reaccionário aos vizinhos hmongs, no seu papel de role model em relação ao adolescente asiático e no legado final do Gran Torino ao jovem. Uma boa história, bem filmada no modo contido habitual a Eastwood, emotivo sem lamechice, e bem interpretada pelo próprio e com destaque para a jovem actriz que faz de Sue. Muito bom.
Subscrever:
Mensagens (Atom)