domingo, fevereiro 25, 2007

Amigos



Vi há alguns dias o filme Mon Meilleur Ami, de Patrice Leconte. É um filme simpático, bem disposto, com um argumento simples e dois bons actores. Trata do tema da amizade, e por coincidência vi-o quando andava a ruminar há alguns dias um texto para aqui – como é habitual, as ideias vão surgindo um pouco ao acaso, do que vejo, leio ou me acontece, e depois componho os textos mentalmente enquanto ando de carro de um emprego para outro ou passeio o cão; umas vezes aproveito-os outras nunca chego a escrevê-los.

Nos últimos meses houve alguns problemas na minha vida que me obrigaram a alterar de forma significativa uma rotina de longa data e que durante muitos anos nunca me passara pela cabeça alterar e me fizeram repensar uma série de coisas. E, como sempre nestas alturas de problemas e mudanças, os meus amigos estiveram comigo para me ajudar, me apoiar e me ouvir. Mais uma vez pude contar com eles e senti que sem eles teria descompensado por completo. Como diz Montaigne (e muito mais gente, decerto), amizade é de facto o melhor sentimento / experiência do mundo, e não é dos menores motivos o facto de depender sempre da nossa escolha – os amigos são a família que nos vamos criando ao longo da vida, podem surgir por acaso – serendipidade! – mas depende da nossa vontade mantê-los e cultivá-los.

Ao longo dos anos, tive várias amizades marcantes; desde os tempos de liceu que as minhas relações com os meus amigos ocuparam uma posição preponderante nos meus afectos. Os acasos da vida, as escolhas feitas por mim ou por eles, as mudanças que cada um de nós foi sofrendo, fizeram que algumas se fortalecessem, outras, mesmo que tivessem sido muito importantes, enfraquecessem ou desaparecessem de todo (a maioria num whisper, mas algumas com um bang).

Não consigo “ordenar” nem “classificar” os meus amigos; cada relação é diferente, tem a sua história, cada um deles é único, mas posso dizer que actualmente há quatro pessoas que são os meus melhores amigos, sem as quais não sei como seria a minha vida, mas imagino-a mais triste, sombria e seguramente mais complicada. Apetece-me falar deles, porque me têm estado muito presentes e porque gosto muito deles, e o simples acto de pensar e escrever sobre eles me dá prazer e me faz sentir bem. Não é uma questão de gratidão, porque na amizade essas questões não se colocam. E para evitar ordenações melindrosas, escolho a ordem cronológica, que é imutável e não dependeu de nenhum de nós.



A mais antiga é uma colega de curso, que conheci no primeiro dia de faculdade. A amizade veio depois, gradualmente, nos últimos anos do curso, e a partir de então foi-se sempre reforçando. Já passámos por casamentos e divórcios, nascimentos e mortes, férias e trabalho, estágios e especializações; esteve presente (felizmente!) em alguns dos momentos mais traumáticos e importantes da minha vida. Já falei dela várias vezes aqui, geralmente chamando-lhe Atena, porque liga bem com a sua personalidade eminentemente racional e sensata, felizmente temperada por alguns traços de loucura (como diz o Fernando Pessoa, “sem a loucura que é o homem / mais que a besta sadia, cadáver adiado que procria?”). Continuamos tão próximos como sempre, conversando e discutindo de tudo um pouco em jantares que se prolongam por cafés pela noite dentro.

O segundo começou por ser um parente por afinidade, tornando-se depois um amigo fiel e presente. Conto com ele em muitas ocasiões, e é um dos meus grandes auxiliares nos problemas e vivências como pai, pois partilhamos a experiência da monoparentalidade. É das poucas pessoas a que aplico sem ironia o termo “coração de ouro”, chegando a provocar-me ciúmes em algumas vezes por sentir que os meus filhos talvez gostassem mais de o ter a ele como pai... Anos de conversas, de férias juntos, é tudo aquilo que se pode desejar de uma relação familiar – não por acaso escolhida e não imposta pelos genes.

Segue-se uma colega de trabalho, com quem convivo quase diariamente há cerca de 15 anos. Ao longo dos anos, temos partilhado quotidianamente alegrias e angústias, problemas e piadas, e considero-a como uma irmã, segura, fiel e afectuosa. É das pessoas com quem passo mais tempo, e tem-me ajudado de forma inestimável em múltiplas ocasiões, sempre incondicionalmente como é característica de uma verdadeira amizade.


Last but not least, um amigo que conheci por acaso na net há pouco mais de 2 anos – e só por isso já teria valido a pena aderir às novas tecnologias! Não há moldes fixos para a amizade, e esta desenvolveu-se rápida e inesperadamente, de tal forma que se eu tivesse de dizer quem era actualmente o meu “melhor amigo” no sentido daquele com quem converso mais vezes, que sabe tudo sobre mim e com quem mais gosto de passar o tempo, seria certamente ele.

As relações humanas são complexas e por vezes estranhas, mas não imagino como poderia passar sem os meus amigos. Há outros de que poderia falar, e sinto-me um pouco injusto por não os referir, mas estes quatro são sem dúvida the top of the top, le crème de la crème. E é graças a eles que me sinto vivo e estimável, e um pouco orgulhoso, pois quem se pode queixar se conseguiu fazer quatro verdadeiros amigos?

1 comentário:

Artur Neves disse...

:-) Fiquei muito contente ao ler este post! :-)