domingo, fevereiro 01, 2009

Déjà vu (a influência dos genes?)


Há dias, quando estava a guardar uma pasta de documentos numa gaveta da cómoda do meu quarto, tive uma sensação de déjà vu. E o que vi foi uma outra cómoda, num outro quarto, igualmente repleta de coisas, desde a óbvia roupa a documentos e fotografias, tal com a minha está. Era uma cómoda antiga, pesada, alta (cerca de 1,50 m), de madeira pintada de tinta castanha num dos acessos de bricolage da minha avó. Estava no quarto do meu avô, e ele guardava ali de tudo um pouco. Lembro-mede como me deliciava bisbilhotá-la, desde o topo, onde se acumulavam resmas de livros de Camilo Castelo Branco em velhas edições, até às gavetas, onde descobri velhas escrituras de hortas e fotografias da minha mãe e tios em crianças. O quarto do meu avô - como aliás toda a casa dos meus avós - era uma inesgotável fonte de deliciosas descobertas quando eu era criança, desde a sala que só era aberta para as grandes ocasiões, como os jantares de Natal, até aos armários da cozinha ou às arcas do sótão.

O facto de os meus avós terem cada um o seu quarto parecia-me inicialmente justificado por viverem numa casa tão grande, só mais tarde me apercebi que era uma consequência da longa guerra que foram os seus 60 anos de casamento. A minha avó governava toda a acasa, e o meu avô vivia praticamente confinado ao seu quarto - o que não significava de modo algum que fosse a parte mais fraca, mas fora o equilíbrio a que tinham chegado. Por motivos diferentes, também eu tenho vivido confinado no meu quarto numa casa grande. E, tal como as coisas do meu avô estavam todas guardadas numa cómoda (aliás, eram duas, do mesmo género) no seu quarto, também as minhas estão numa, que embora bem diferente, comprada na moderna Ikea, acaba por cumprir as mesmas funções. E foi essa a sensação que tive no momento em que estava a guardar numa gaveta a pasta de documentos, junto ao carregador do telemóvel, ao passaporte e outras utilidades - é assim que a história se repete em diferentes gerações? São os meus módulos de gavetas da Ikea a nova versão da velha e pesada cómoda do meu avô? Um avô de que herdei outra característica - a de dormir de janela aberta todo o an, faça frio, chuva ou sol.

1 comentário:

Cristina Loureiro dos Santos disse...

Fizeste-me chorar...
Saudades da nossa infância...
Tens razão, sabes? A casa dos avós era uma fonte de surpresas.

Beijinhos :))

[Adorei ler!]