Reli recentemente Crime e Castigo, e foi absolutamente como se o estivesse a ler pela primeira vez. Pergunto-me mesmo onde teria a cabeça quando o li há muitos anos - a resposta é simples, no entanto: num período conturbado da minha vida e mais absorvido em outros assuntos. Mais precisamente, foi num Verão em que andava profundamente infeliz por uma paixão sem esperança, e a estudar Anatomia I, a cadeira mais terrível do 1º ano - e acho que de todo o curso - de Medicina. Durante cerca de um mês li, entre outros de que não me lembro, Crime e Castigo e Fado Alexandrino. O segundo detestei, e o primeiro não me deixou qualquer impressão e esqueci-o quase completamente. Só muitos anos depois me apaixonei por Dostoievsky, ao ler Os Possessos; desde então li vários, sempre com o mesmo entusiasmo, e fui adiando a releitura de Crime e Castigo - talvez com receio de uma decepção - até agora.
E de facto não sei como me pôde deixar indiferente... Falta de maturidade? Não é o melhor de Dostoievsky - gostei mais de Os Possessos, Os Irmãos Karámazov e O Idiota, por exemplo - mas é excelente. Dostoievsky escreve sempre com uma paixão inigualável, as suas personagens são sempre terrivelmente fortes e reais, a sua descrição dos sentimentos, violentos e angustiantes, é sempre poderosa e convincente. O dilema da escolha, da responsabilidade pessoal do Bem e do Mal, e neste caso da culpa e do remorso, é um dos seus temas recorrentes e que expõe sempre como um mestre. Como diz Virginia Woolf em The Common Reader, somos arrastados num turbilhão de emoções tempestuosas (se não diz exactamente isto, é algo do género, num ensaio excelente sobre os romances russos), mas saímos desse turbilhão mais vivos e conscientes, e mais ricos; deixamos a poeira assentar e sentimos que compreendemos melhor o mundo e as pessoas. Decididamente, gosto imenso de Dostoievsky.
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