domingo, março 09, 2008
Virginia Woolf, de Hermione Lee
Li recentemente a biografia de Virginia Woolf por Hermione Lee, que achei excelente. Não só é extensa e bem documentada, como sobretudo está muito bem escrita e a autora tentou transmitir a pessoa de Virginia Woolf tanto quanto possível como se fosse ela própria a exprimir-se, ou os seus próximos a descrevê-la, utilizando constantemente as palavras da escritora (dos livros, contos, ensaios, diários, cartas, socorrendo-se do extenso material existente) ou dos seus amigos e conhecidos. A tarefa de ligar todos estes testemunhos numa trama coerente e agradável de ler, interpretando-os e organizando o livro numa cronologia não excessivamente rígida mas rigorosa e documentada, não foi certamente fácil mas está muito bem conseguida. Não é uma biografia muito mais detalhada do que a de Quentin Bell, que li há muitos anos e que é igualmente muito boa e muito bem escrita, e por vezes enferma de um defeito muito comum às biografias, que é o de querer dar a todos os pormenores (sobretudo da infância) um significado posterior provavelmente maior e certamente muitas vezes diferente do que na realidade tiveram - fico sempre com a sensação de que este ou aquele pormenor foi isso mesmo, um pormenor, a que não se ligaria importância se não se estivesse a escrever uma biografia.
Mas aparte a qualidade técnica da biografia, que é de resto um género literário que cada vez aprecio mais, tal como memórias e ensaios, o maior prazer da leitura deveu-se à própria Virginia Woolf, às suas palavras, às suas ideias, à sua vida. Quanto mais passa o tempo, mais me sinto identificado com ela e parte do grupo de Bloomsbury - a sua curiosidade, os seus dilemas, a sua franqueza, o humor, a ironia, as contradições, as fraquezas, a maledicência, o amor das ideias e da conversação, o comodismo, o liberalismo... Sempre admirei imenso essa geração que rompeu as convenções da época vitoriana e do século XIX e contribuiram à sua maneira - e não foi pouco - para o modernismo e o liberalismo, sem falsas virtudes nem hipócritas heroísmos ou sacrifícios.
E sinto uma simpatia e ternura especial pela própria Virginia Woolf, mesmo com a sua língua temível e o seu humor sarcástico e implacável, pela sua honestidade e curiosidade intelectuais, pelo seu imenso talento, pela sua escrita poética e tão perfeita, pela sua longa luta com a doença mental e pela derrota final, quando se rendeu ao pavor de enlouquecer. E senti também no livro de Hermione Lee esse amor não condescente mas repassado de respeito e admiração por Virginia Woolf.
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