quinta-feira, abril 26, 2007
Ana Karenina, de Leão Tolstoi
Reler Ana Karenina é sempre um prazer, embora depois de reler também Guerra e Paz este se tenha tornado o meu preferido de Tolstoi. Provavelmente por ser mais vasto e abrangente, e por as questões nele abordadas actualmente me interessarem mais. Mas claro que isso não retira méritos a Ana Karenina, que me fascinou aos 15 anos e se mantém um livro excelente.
A história é por demais conhecida: o drama de Ana Karenina, destruída pela pressão das convenções que afronta ao deixar o marido por outro homem, e a par os dilemas existenciais de Levine que, tal como Pierre Bezukhov em Guerra e Paz, reflecte as preocupações do autor sobre o sentido da vida. E, tal como Pierre, Levine encontra o apaziguamento no final ao aceitar a vida como ela é e ao tomar como o seu objectivo o cumprimento do bem, no sentido dos valores de uma ética humanista desenvolvida pela nossa civilização ao longo dos séculos, e a que ele à falta de melhor termo chama fé. Mas mesmo ao dar-lhe esse nome e ao aceitar que ele se personifica na religião, ao referir todos os outros, a humanidade não cristã (e lembremo-nos que a religião de Tolstoi não é a católica mas a ortodoxa), torna claro que pensa nos valores éticos, e não em revelações, dogmas ou credos.
E mais uma vez me delicio com a perspicácia e sensibilidade de Tolstoi na construção das suas personagens, que são incrivelmente reais, mais uma vez dou comigo a pensar: "é exactamente assim!".
"Ela apareceu-lhe de repente, ou pelo menos o que restava dela, quando, entrando como um doido na barraca junto da linha, para onde a haviam transportado, viu o seu corpo [...] Os lábios entreabertos pareciam prestes a proferir ainda a sua terrível ameaça e predizer-lhe, como na sua última entrevista, "que ele se arrependeria". Por mais que quisesse, desde então, evocar o seu primeiro encontro, também na estação, procurar revê-la na sua poética e encantadora beleza quando, transbordante de vida e de alegria, ela ia para a felicidade e a sabia dar, era sempre a sua imagem irritada e animada duma implacável necessidade de vingança que ele revia, e as alegrias do passado ficavam-lhe envenenadas para sempre..."
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